É fundamental e possível a introdução de alterações para a valorização do trabalho e dos trabalhadores.
A Proposta de Orçamento do Estado para 2021 (POE) não responde à mudança de rumo que se exige para garantir as necessidades dos trabalhadores e do País, embora contenha algumas medidas que, de forma muito insuficiente, vêm ao encontro de reivindicações da CGTP-IN.
A CGTP-IN entende que na fase de discussão em curso, é possível e fundamental a introdução de alterações que traduzam a opção pela valorização do trabalho e dos trabalhadores, pelo apoio à recuperação económica e desenvolvimento soberano do País, medidas de garantia das retribuições e do emprego, e de investimento nos serviços públicos e Funções Sociais do Estado com a sua capacitação para a resposta necessária na actual situação e para o futuro.
Para 2021 o Governo continua sem responder à exigência do aumento dos salários dos trabalhadores da Administração Pública.
A POE é muito limitada no que respeita ao aumento das pensões e reduzida nas que abrange, para além de manter o valor do IAS, tendo inclusive uma marca assistencialista em várias áreas.
A mesma política, feita ao serviço dos mesmos interesses, vai produzir os mesmos resultados, os mesmos estrangulamentos e o agravamento dos problemas estruturais. É preciso mudar de rumo.
QUEBRA ECONÓMICA ABRUPTA E SEVERA, MAS QUE PODERIA TER SIDO MENOR
A CGTP-IN considera que a quebra prevista para 2020 (8,5%) poderia ter sido menor, com a manutenção do nível de consumo privado - através da garantia das retribuições integrais dos trabalhadores e da proibição dos despedimentos. Bem como com um maior esforço orçamental. Este foi de apenas 2,7% do PIB, um valor abaixo do verificado na generalidade dos países europeus.
A diminuição da riqueza criada, medida pela variação do PIB nominal, ascende a 14,9 mil milhões de euros (MM€), o que excede a dotação prevista para Plano de Recuperação e Resiliência para 2021-2026 (cerca de 14 MM€). A CGTP-IN não desvaloriza os fundos europeus, que envolvem também as verbas do Quadro Financeiro Plurianual e empréstimos, mas também não os sobrevaloriza.
A recuperação económica em 2021 irá depender da resposta aos problemas dos trabalhadores; da evolução da situação epidémica; da recuperação nos outros países; do aumento do investimento público; do contributo dos planos de recuperação com o uso de fundos europeus, sendo, pois, necessário clarificar os prazos em que serão libertados estes fundos, e as condicionalidades a que podem estar subordinados e que podem ser contrários aos interesses nacionais, assim como os cortes previstos no quadro Financeiro Plurianual.
A recuperação económica depende também e crucialmente da procura interna (consumo e investimento), tal como comprovam os anos mais recentes. No consumo, a evolução é determinada sobretudo pela recuperação do emprego, a diminuição do desemprego, os salários e as pensões.
O investimento público (IP) tem aumentos significativos, da ordem dos 20%, em 2020 e em 2021. Mas este investimento teve um baixo valor no período 2012 a 2019 (média de 2%), muito distante do período 2000 a 2010 (média de 4,3%). Um estudo recente do FMI conclui que o IP tem fortíssimos efeitos no PIB e no emprego. A POE aponta para um aumento do PIB de 5,4%, um valor inferior à quebra de 2020, um baixo aumento do salário mínimo, o congelamento das pensões, assim como dos salários na Administração Pública e um nível insuficiente do IP. Para a CGTP-IN uma política económica no sentido do que aqui propomos levaria a um aumento muito mais significativo do PIB em 2021.
A CGTP-IN considera inaceitável o cálculo da produtividade em 2020 baseado na variação do emprego, que aponta para uma quebra de 4,8%, não tendo em conta as horas trabalhadas. Segundo o INE, o PIB por hora trabalhada (ou seja, a produtividade do trabalho), teve um aumento de 9,6% no 2º trimestre.
A ideia de que a POE visa sobretudo a protecção do rendimento em desfavor das empresas é mistificatória porque ignora todos os apoios às empresas (por exemplo, os benefícios fiscais) e porque contabiliza nos apoios aos trabalhadores medidas que, como o "lay-off", significam um corte salarial quando se subsidiam salários, que devem ser pagos pelas empresas e não pelo Estado.
A VALORIZAÇÃO DO EMPREGO E DOS SALÁRIOS PARA DINAMIZAR A ECONOMIA
Em 2021, o emprego ficará abaixo dos 4,8 milhões, sendo inferior ao existente em 2019 em 139,4 milhares (-2,8%) e a taxa de desemprego prevista é de 8,2%. As medidas adoptadas pelo Governo não impediram a destruição de emprego e o aumento do desemprego. Não se proibiram os despedimentos, nomeadamente dos trabalhadores com vínculos precários, e as medidas de apoio às empresas, como as relativas ao "lay-off", não garantiram na íntegra os salários.
Os despedimentos de trabalhadores não permanentes reclamam um combate efectivo à precariedade, o que passa pela revogação das normas que permitem a sua existência, agravadas na última revisão do Código de Trabalho com o aumento do período experimental entre outras, e pelo reforço da fiscalização e competências da Autoridade para as Condições de Trabalho (ACT), que tem de ter uma orientação política clara, nomeadamente de verificação dos fundamentos dos contratos de trabalho não permanentes.
O mecanismo de apoio à retoma progressiva continuará em vigor em 2021, pelo que a CGTP-IN volta a reivindicar que nas empresas apoiadas se garanta a totalidade dos salários, a não concessão indiscriminada de apoios com base apenas em quebras de facturação e a proibição de despedimentos.
Os incentivos às empresas devem ser limitados às que comprovadamente deles necessitem e que assegurem a criação de emprego permanente bem como criação líquida de emprego sem termo. A eficácia do denominado “Regime extraordinário e transitório de incentivo à manutenção de postos de trabalho” em vigor será diminuta: abrangerá apenas grandes empresas, os postos de trabalho só terão que ser mantidos em 2021, cinge-se a um número limitado de incentivos e não salvaguarda a proibição de despedimentos de trabalhadores com vínculos precários.
A CGTP-IN defende: o salário mínimo deve passar para 850 euros no curto prazo; o aumento salarial para todos os trabalhadores de 90 euros, nomeadamente para os trabalhadores da AP; a redução gradual do tempo de trabalho para as 35 horas para todos e sem redução de salário.
O AUMENTO DA DÍVIDA PÚBLICA REPRESENTA UMA AMEAÇA
A POE prevê uma redução da dívida pública em percentagem do PIB de 134,8% este ano para 130,9% em 2021. Mas a dívida nominal volta a subir cerca de 17 MM€, fixando-se, em termos líquidos, nos 287,3 MM€. Os encargos da dívida representam mais de 7,5 MM€.
A CGTP-IN entende que estes valores são insustentáveis, reafirmando a exigência de renegociação da dívida nos seus montantes, prazos e juros. Prevê-se que até 2031 a dívida continue acima dos 100% do PIB e que os seus encargos absorvam mais de 3,1% desse mesmo PIB. São verbas avultadas que faltam no investimento público e a um desenvolvimento soberano do país.
Na despesa, a POE reflecte desequilíbrios que se perpetuam a que se juntam novas ameaças. Nas PPP, há um novo crescimento da despesa, nomeadamente com as PPP rodoviárias prevendo-se 1,2 MM€ de encargos. Em 2019 previa-se que, em 2021, a despesa com estas PPP fosse de mil milhões, ainda que em 2016 a previsão para 2021 fosse de 873 milhões - uma revisão sempre em alta que traduz contratos leoninos que prejudicam o Estado para garantirem elevadas taxas de rentabilidade à parte privada do negócio. A CGTP-IN exige a renegociação de todas as PPP e a não celebração de qualquer novo contrato, uma vez que estas parcerias se traduzem numa assunção dos prejuízos pelo Estado e a garantia de lucros aos privados.
No sector bancário, mantêm-se velhos problemas, nomeadamente em consequência da desastrosa opção na resolução do antigo BES e do Novo Banco. Com montantes que já se aproximam dos 9 MM€, a CGTP-IN considera que esta instituição deve passar para controlo público, fortalecendo a presença e intervenção do Estado no sector financeiro.
A solução encontrada para a TAP dá força à exigência de que a empresa seja 100% de capitais públicos. Os apoios previstos, que poderão ficar aquém do necessário, resultam em parte da crise que o sector atravessa, mas também é fruto de uma gestão com aspectos danosos, nomeadamente da operação no Brasil.
No plano fiscal, continua-se a adiar a tributação dos rendimentos de capital e a não aliviar os que têm origem no trabalho, com a não introdução de mais escalões no IRS, que trariam uma maior progressividade e justiça ao sistema fiscal. A opção por alterações na retenção na fonte, apenas antecipam receita dos contribuintes e não contribuem para a transformação de que o edifício fiscal carece. A CGTP-IN há muito que apresentou uma proposta global com vista à promoção de uma maior justiça fiscal, que se mantém válida e que, caso fosse adoptada, no seu todo ou em parte, promoveria um acréscimo dos recursos financeiros para o Estado, com o desagravamento da tributação sobre os rendimentos do trabalho a ser compensada pela taxação do capital.
No IRC, regista-se um aumento da despesa fiscal de 671,3 MM€ entre 2018 e 2021, faltando realizar uma avaliação rigorosa da atribuição dos benefícios fiscais que lhe estão na origem.
Na contribuição extraordinária sobre o sector energético, num contexto em que há empresas que não têm pago esta contribuição, a CGTP-IN denuncia a intenção do governo de, numa cedência aos interesses privados, aligeirar o regime, na sua incidência e nas taxas a aplicar.
Na contribuição extraordinária sobre os fornecedores da indústria de dispositivos médicos do SNS, não se compreende o abatimento ao valor da contribuição nas despesas de investigação e desenvolvimento que, naturalmente, já estão incluídas no preço dos dispositivos adquiridos pelo SNS.
Por último, no respeitante às imposições de contenção orçamental da UE, que estão suspensas em 2020 e 2021, não só se refere que estas imposições podem voltar a vigorar em pleno, como se vislumbra na POE o efeito desta pressão/opção pelas restrições orçamentais.
RESPEITAR OS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA; MELHORAR OS SERVIÇOS PÚBLICOS
A melhoria dos salários é determinante para dinamizar a economia tanto no sector privado como na Administração Pública (AP), onde não houve aumentos desde 2009 com uma perda de 12,1% de poder de compra entre 2010 e 2019. Em 2020 houve uma irrisória actualização de apenas 0,3%.
Por outro lado, a Tabela Remuneratória Única está completamente degradada, mantendo formalmente remunerações inferiores ao salário mínimo nacional e não respeitando a proporcionalidade entre os diversos níveis remuneratórios, ao mesmo tempo que mantém trabalhadores com mais de 20 anos de trabalho com salários correspondentes ao SMN e não respeita, nem valoriza, a experiência profissional.
Prevê-se um aumento de 3,5% da massa salarial em 2021, que se deve sobretudo a progressões nas carreiras e a novas contratações. A anunciada actualização do salário mínimo nacional é profundamente insuficiente. Para a CGTP-IN, o aumento dos salários dos trabalhadores da AP é indissociável da melhoria dos serviços públicos a prestar à população.
A POE continua também a não dar resposta à necessidade de assegurar a indemnização devida aos trabalhadores por acidente em serviço.
A AP tem falta de trabalhadores. No fim de 2019 existiam menos 23,6 mil postos de trabalho do que no final de 2011. Na saúde, o seu número não é suficiente e há o risco de perdas devido à idade média elevada e a saídas. Para 2021, a POE prevê um “substancial rejuvenescimento” devido à aplicação da regra de pelo menos uma entrada por cada saída, à entrada dos trabalhadores e a programas de estágios, mas o governo não se compromete com números, não estabelece calendário, não se sabendo o tipo de vínculo das contratações e saídas previstas. A precariedade agravou-se. Há hoje mais de 80 mil trabalhadores com contratos a prazo (11,4% do total) e 16,7 mil prestações de serviços, a maioria das quais falsas.
A CGTP-IN reivindica: a eliminação de todas as formas de precariedade e a abertura de procedimentos concursais que garantam a estabilidade de emprego; a imediata conclusão do PREVPAP e a integração de todos os trabalhadores dele excluídos bem como dos admitidos com recurso a vínculos precários depois do programa.
Regista-se a inscrição do suplemento de penosidade e insalubridade, mas a sua formulação, de onde desaparece a palavra risco, e o seu âmbito, são extremamente reduzidos, abrangendo apenas assistentes operacionais das áreas da higiene urbana e saneamento das autarquias locais, deixando de fora trabalhadores que estão também sujeitos a condições de risco muito elevado e a sua aplicação não está assumida. Assim, será importante referir que a última regulamentação prevista foi arrastada durante 22 anos, pelo que se exige que tal não volte a acontecer. Além disso, a Proposta é genérica sobre a SST e não garante que todos os trabalhadores usufruam de condições mínimas adequadas de prevenção de acidentes de trabalho e doenças profissionais.
A POE refere o reforço da ACT, mas o seu orçamento previsto não reflecte a possibilidade real da sua concretização. Prevê-se o cumprimento dos rácios internacionalmente recomendados nos “próximos anos”. Para a CGTP-IN defender o reforço da ACT é hoje mais urgente, pois o patronato, principalmente nas grandes empresas, utiliza a epidemia para violar os direitos laborais.
A SEGURANÇA SOCIAL É MARCADA POR CONCEPÇÕES ASSISTENCIALISTAS
O saldo global continua positivo, mas com uma forte redução, representando em 2021 apenas 1/3 do verificado em 2019. A CGTP-IN considera muito negativo que até agora não tenham sido concretizadas parte das transferências que correspondem às medidas Covid e à diversificação das fontes de financiamento. Prevê-se que tal aconteça, mas a POE não discrimina as verbas relativas à Covid em 2020. Estas verbas, embora se reduzam, voltam a ser significativas em 2021 (776M€) e não estão totalmente cobertas por transferências do OE. A diferença pode exceder os 200 M€. A Segurança Social não pode ser utilizada como instrumento de política económica.
A previsão de uma transferência extraordinária de 517 M€ para assegurar em 2021 o equilíbrio financeiro do Sistema Previdencial prejudica a diversificação das fontes de financiamento. Não está em causa a transferência em si, mas a justificação dada, que transmite a ideia errada de incapacidade de financiamento quando o problema reside em causas totalmente externas.
A CGTP-IN valoriza um novo aumento extraordinário das pensões, mas considera incompreensível que, ao contrário do que sucedeu este ano, apenas ocorra em Agosto, abrangendo menos de metade do ano. Um aumento que não abrange todas as pensões (tendo como limite as pensões até 658€) e que, sendo já de si em valor manifestamente insuficiente, se torna ainda mais insignificante, se considerado todo o ano.
É inaceitável que em 2021 não haja lugar ao aumento regular das pensões. Ainda que da aplicação das regras em vigor resulte a sua não actualização, considera-se justo que se previsse um regime especial de actualização, tal como ocorreu em 2009. A justiça social exige a actualização das pensões. A sociedade deve valorizar e respeitar o seu compromisso com os mais idosos, que trabalharam e contribuíram toda uma vida, sendo inaceitável a degradação do valor das pensões; é imperativo mudar a política de actualização de pensões pois discrimina os pensionistas em função do seu rendimento, o que desvaloriza o sistema contributivo e imprime uma marca assistencialista no direito à pensão.
Também se discorda da não actualização do IAS, o que implica a estagnação das prestações sociais que lhe estão indexadas, atingindo especialmente as pessoas de menores rendimentos e em maior risco de pobreza.
A CGTP-IN propõe a suspensão transitória das regras de actualização das pensões e do IAS para 2021 e a criação de um regime especial de actualização, permitindo o aumento de todas as pensões e do IAS. Uma medida que deverá ser complementada com a alteração da actual lei, de forma a assegurar a actualização anual destas prestações.
O aumento do limiar mínimo do subsídio de desemprego é insuficiente face ao aumento do desemprego, à baixa cobertura das prestações de desemprego e ao grau de pobreza dos desempregados (47,5% em 2018). O aumento é mínimo e não abrange todos os desempregados, mas apenas aqueles onde a remuneração que serve de base ao cálculo da prestação corresponde pelo menos ao salário mínimo nacional.
As restantes previsões, nomeadamente a condição especial de acesso ao subsídio social de desemprego subsequente e a majoração do subsídio de desemprego para casais desempregados, apesar de relevantes, não respondem a problemas específicos já anteriormente verificados e não são adequados à resolução de questões como a ausência ou insuficiência de protecção no desemprego e a alta taxa de pobreza.
Neste sentido, a CGTP-IN propõe: a redução do período de garantia para acesso ao subsídio de desemprego; o aumento do valor do subsídio de desemprego, nomeadamente através da indexação dos respectivos limites ao salário mínimo; o alargamento dos períodos de concessão do subsídio de desemprego e do subsídio social de desemprego subsequente; a eliminação do prazo de garantia para acesso ao subsídio social de desemprego; a alteração das condições de acesso ao subsídio social de desemprego, nomeadamente alterando as regras de cálculo da condição de recursos (eliminar a regra da capitação e restringir o conceito de agregado familiar); o aumento do valor do subsídio social de desemprego, fixando-o no valor do salário mínimo; a revogação da aplicação do factor de sustentabilidade ao cálculo das pensões antecipadas na sequência de desemprego de longa duração.
É FUNDAMENTAL O COMBATE À POBREZA, NOMEADAMENTE AQUELA QUE AFECTA OS TRABALHADORES
Têm-se multiplicado, desde o início da pandemia, os apoios extraordinários em situações de desprotecção social, caracterizados pelo seu âmbito restrito e pelo seu baixo montante, irrisório, nalguns casos.
A nova prestação prevista é mais um dos apoios avulsos, dirigido desta vez a uma multiplicidade de situações, com condições de acesso muito diversas e todas extremamente complexas, e montantes diferenciados que vão desde os €50 ao valor do limiar de pobreza. A CGTP-IN valoriza as intenções subjacentes, mas entende que as dificuldades de acesso e o seu reduzido valor, não permitem satisfazer as necessidades básicas de todos os trabalhadores que a pandemia deixou vulneráveis. Além de que o sistema público, nas vertentes previdencial e de solidariedade, já dispõe dos instrumentos para acorrer à maioria destas situações, necessitando apenas de alguns ajustamentos em termos de âmbito de aplicação, condições de acesso e valores.
A CGTP-IN propõe que, independentemente de se criarem novas prestações, a prioridade deve ser o reforço substancial das existentes, designadamente as prestações de desemprego (nos termos já referidos), mas abrangendo também, com as devidas adaptações, as prestações por cessação de actividade dos trabalhadores independentes, e do RSI, para os trabalhadores com perda total ou substancial de rendimento.
A CGTP-IN valoriza o alargamento da gratuitidade das creches a todas as crianças integradas em agregados familiares pertencentes ao 2º escalão de rendimentos de comparticipação familiar, por contribuir para reduzir as despesas das famílias neste momento difícil.
O alargamento e requalificação de equipamentos sociais são igualmente muito importantes, mas a CGTP-IN considera que este objectivo deve ser concretizado através do aumento da rede pública nas várias respostas sociais. A pandemia tem demonstrado que a reduzida dimensão, a falta de condições e a insuficiência de pessoal qualificado, sobretudo nos lares de idosos, estão a ter consequências desastrosas.
É essencial o alargamento da rede pública de apoio à infância, aos idosos e às pessoas com deficiência, a requalificação profunda das estruturas existentes, a contratação de trabalhadores devidamente qualificados e a revisão das condições de funcionamento, introduzindo padrões de maior exigência em termos de instalações, regras de ocupação e assistência aos utentes.
É NECESSÁRIO VALORIZAR OS TRABALHADORES E REFORÇAR OS SERVIÇOS PÚBLICOS E AS FUNÇÕES DO ESTADO, NOMEADAMENTE NA SAÚDE, NA EDUCAÇÃO E NA JUSTIÇA
Os serviços públicos não surgem reforçados nesta POE. Aparentemente, há um crescimento, mas que é negado quando se retiram as verbas provenientes de fundos europeus, que correspondem a candidaturas apresentadas anteriormente, destinando-se a fins específicos e não dando resposta a problemas de natureza estrutural que careciam de um efectivo investimento público, continuado e em crescendo, nomeadamente, e entre outras, nos transportes e telecomunicações. O aumento de financiamento público na saúde é curtíssimo e nas restantes áreas verifica-se mesmo um decréscimo.
A contratação de trabalhadores para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) não tem sido suficiente, nem face ao quadro actual, nem face à saída futura de trabalhadores por motivo de aposentação ou para o sector privado, nem quando se consideram as necessidades crescentes neste domínio, devido ao envelhecimento, entre outras razões. Acresce que muitos foram contratados com contratos a prazo ou com prestações de serviços, falsas na maioria dos casos.
A epidemia demonstrou o papel insubstituível do SNS, mas a resposta poderia ser melhor, tendo mais meios, e houve desvio de recursos para o combate à Covid 19 que se reflectiram nos cuidados prestados. De Janeiro a Julho de 2020 houve um decréscimo de mais de 1 milhão de consultas médicas de cuidados de saúde primários (-5,9%), quase 1 milhão de consultas médicas hospitalares (-13,6%) e menos 1 milhão de episódios de urgência (-27%) e - 26,6% cirurgias programadas. É urgente um grande investimento no SNS e medidas para diminuir as desigualdades na saúde que penalizam mais os utentes com menores rendimentos. É preciso acabar com a dependência do sector privado. A CGTP-IN repudia a posição dos bastonários que pressionam para que se recorra aos privados e ao sector social.
O Governo afirma que em 2021 se prosseguirá com “a aposta nos Cuidados de Saúde Primários” com vista a “aumentar os níveis de cobertura”, o que requer um reforço do investimento no SNS. São necessários mais médicos de família, pois o número de utentes sem médico aumentou 40 mil entre 2018 e 2019, para os 730 mil. É urgente a internalização de meios complementares de diagnóstico e terapêutica.
A CGTP-IN considera fundamental a contratação de mais trabalhadores para o SNS, sendo insuficientes os 4.200 que o Governo prevê, mas as contratações devem ser permanentes e deve-se definir um plano de longo prazo de contratações, tendo em conta as necessidades actuais e futuras e as saídas previsíveis.
Quanto ao subsídio extraordinário e transitório aos profissionais de saúde do SNS ou integrados no Ministério da Saúde, que exerçam funções em regime de trabalho subordinado, e pratiquem de forma permanente actos directa e maioritariamente relacionados com pessoas suspeitas ou doentes infectados com COVID-19, considera-se que, sendo o risco e a penosidade inerentes à natureza das funções e não à tipologia dos serviços e/ou da situação clínica dos doentes, deveria abranger todos os trabalhadores da saúde, evitando discriminações que podem causar instabilidade nos serviços e maior dificuldade na sua organização. A CGTP-IN considera mesmo que o subsídio deve ser extensível e permanente para todos os trabalhadores dos serviços públicos essenciais.
O investimento de 27 M€ no alargamento da rede de cuidados continuados integrados é positivo e necessário, mas este alargamento deve acontecer no âmbito da esfera da gestão pública.
Na educação a CGTP-IN considera que as verbas previstas são insuficientes, face aos problemas de ordem estrutural que afetam o sector.
É urgente o reforço e rejuvenescimento do corpo docente e não docente das escolas; faltam professores em várias áreas; as turmas continuam sobredimensionadas, não se tendo sequer reduzido com a situação sanitária; faltam muitos outros recursos, afectando a qualidade das aprendizagens, discriminando alunos que necessitavam de medidas de discriminação positiva e agravando as desigualdades. A previsão de contratação de 3000 mil assistentes operacionais é insuficiente face às necessidades estimadas (5000), exigindo-se que os contratos sejam permanentes.
Sem prejuízo da valorização do investimento na digitalização, da redução das propinas e do alargamento das bolsas da acção social e do alargamento da rede pública no pré-escolar, consideramos, porém, que o esforço orçamental deveria ser maior atendendo à forte redução do financiamento público num período prolongado (-1,5 pontos percentuais face ao PIB entre 2001 e 2019). Este subfinanciamento teve consequências nas condições de trabalho nas escolas, em tempo de serviço cumprido pelos profissionais mas não contabilizado, no acelerado envelhecimento do corpo docente (54% acima dos 50 anos e só 0,5% até aos 30), no arrastamento da precariedade e em abusos e irregularidades nos horários de trabalho.
Também em relação ao ensino superior e à ciência, as verbas previstas ficam aquém das necessidades de um setor em que as dificuldades se reflectem numa situação de subfinanciamento crónico, muitas vezes suportado por um esforço muito grande das famílias e, com particular expressão na ciência, pelo arrastamento durante anos a fio de situações de grande precariedade.
Os problemas na justiça laboral, agravados pela epidemia, manter-se-ão. A POE é omissa quanto à melhoria das condições de trabalho e ao reforço de pessoal, o que é preocupante num período em que os trabalhadores necessitam de recorrer aos tribunais face aos maiores abusos patronais. Prevê-se a manutenção dos valores das custas processuais, mas nada se diz sobre o aumento do financiamento ao instituto do apoio judiciário. A exiguidade do apoio judiciário constitui uma barreira. É fundamental garantir que o acesso aos tribunais e ao sistema de justiça não seja entravado por insuficiência económica.
21.10.2020