privatizaçãoO sector empresarial do Estado - Alavanca para o desenvolvimento. A constituição de um forte Sector Empresarial, logo após o 25 de Abril, foi o resultado do processo de democratização e permitiu assegurar melhorias substanciais na mobilidade das populações; o alargamento da rede eléctrica, de gás, de água e saneamento, bem como da rede postal e de telecomunicações a todo o país; garantiu serviços públicos fundamentais de norte a sul do território; permitiu dinamizar a cultura e a informação; possibilitou, ainda que por pouco tempo, colocar o sector financeiro ao serviço do sector produtivo, das populações e do país.

O Sector Empresarial do Estado constitui um importante pilar do desenvolvimento do país, um instrumento fundamental de política económica, social, cultural e de redução das profundas assimetrias regionais, e um veículo para o cumprimento dos direitos sociais da população portuguesa. As privatizações e o desmantelamento do sector público desencadeado pelos sucessivos governos ao longo dos últimos 25 anos, deixaram o país mais pobre e desigual, as populações com a satisfação das suas necessidades hipotecada e os trabalhadores com os seus direitos degradados.

AS PRIVATIZAÇÕES DEIXARAM O PAÍS MAIS POBRE

A partir da revisão constitucional de 1989 e a publicação da Lei-quadro das privatizações (1990), iniciou-se o processo de reprivatizações com fortes e negativas implicações sociais, financeiras e económicas.

No plano social, o país está hoje mais desigual, não só na distribuição do rendimento entre o trabalho e o capital, mas também com o crescimento das assimetrias regionais, com o acentuar da clivagem entre o interior e o litoral. A degradação do interior do país e das condições de vida dos que aí habitam anda de mãos dadas com o encerramento dos serviços públicos entretanto privatizados e sujeitos à lógica do lucro. De forma cumulativa, o seu encerramento representa para muitas das regiões o fim da principal fonte de emprego e o último reduto que permite a fixação de alguma população em idade activa.

Financeiramente, o rol de privatizações dos últimos 25 anos retirou ao Estado milhares de milhões de euros em receitas, quer por via da alienação das empresas mais lucrativas, quer por via de receitas de impostos, uma vez que a entrega dos sectores estratégicos ao capital estrangeiro faz com que parte dos lucros não seja tributado em Portugal. Por outro lado, um dos mais propalados argumentos para justificar as privatizações, de que estas seriam necessárias para abater na dívida pública, cai por terra quando se verificou que não só a dívida pública não desceu, como continuou a aumentar de forma exponencial, nomeadamente nos últimos quatro anos.

No plano económico, as consequências das privatizações foram a destruição de fileiras produtivas, o encarecimento das tarifas e do custo dos serviços, a deterioração dos serviços públicos privatizados, a redução do número de trabalhadores.

O RESULTADO DAS PRIVATIZAÇÕES

No sector industrial, assistiu-se a um acentuado definhamento de várias das empresas privatizada.

A reprivatização do sector financeiro, teve como consequência a primazia da actividade especulativa, em detrimento da actividade produtiva. Por outro lado, a colocação do sector financeiro ao serviço dos lucros e dividendos, conjugada com a profunda promiscuidade existente entre os sucessivos governos e os grupos financeiros, levou à falência de dois bancos BPN e BES, o primeiro do qual conduziu a um prejuízo até agora identificado numa verba superior a 4 mil milhões de euros para a população, sendo que os desenvolvimentos no processo de dissolução do segundo poderão levar ao mesmo resultado.

Como agravante, temos a menorização e desaproveitamento do papel que a CGD pode e deve ter, como instituição pública ao serviço do interesse nacional, e a sua colocação ao serviço dos grandes grupos económicos e financeiros, usando-a para canalizar colossais verbas para cobrir negócios ruinosos, nomeadamente de alguns bancos privados. Com a entrega à esfera privada de importantes e lucrativas áreas como sejam o ramo segurador da CGD, ou a presença na saúde, para além de enfraquecer e subtrair valor ao Grupo Caixa, abre também a porta à sua eventual privatização.

O sector energético, cuja privatização começou em 1997 e terminou em 2011 pela mão deste Governo, conheceu aumentos sucessivos nas tarifas, quer do gás, quer da electricidade, quer dos combustíveis. Entre 1997 e 2014, os preços da gasolina e do gasóleo mais do que duplicaram. Simultaneamente, só a Galp e a EDP, sem considerar a REN, distribuíram, nos últimos cinco anos, cerca de 3,7 mil milhões em dividendos.

No sector das comunicações, a Portugal Telecom, uma das maiores empresas portuguesas de graças aos enormes investimentos estatais, ficou reduzida a uma mera subsidiária da brasileira Oi e refém dos interesses dos accionistas que tudo fizeram em benefício próprio, de forma a incrementar lucros e dividendos durante e após a fusão das duas empresas. O estado a que chegou a PT, obriga a uma intervenção imediata do Estado para impedir a destruição desta empresa reorientando a sua actividade para servir o interesse público. Também neste sector, a venda dos CTT, empresa de referência com um papel fundamental na ligação às populações, constitui uma opção inadmissível que interessa reverter.

No que concerne aos resíduos sólidos urbanos, a privatização da EGF – Empresa Geral do Fomento, representa a alienação de uma área vital para a saúde pública e o bem-estar das populações. A privatização da EGF, que apresenta lucros significativos, coloca ainda mais pressão sobre o Poder Local que fica sujeito às regras impostas pelos interesses privados que passam a fazer do tratamento e valorização dos resíduos, um negócio que não está desligado de um outro que visa a privatização da água.

A privatização no sector dos transportes públicos – fora dos centros urbanos de Lisboa e Porto – conduziu à deterioração do serviço, nomeadamente como a redução do número de carreiras e da sua frequência, ou do seu total desaparecimento, a piores composições, bem como ao aumento dos bilhetes e passes sociais. É correcto afirmar, portanto, que privatização de grande parte deste sector veio negar e cercear o direito à mobilidade de parte da população portuguesa, nomeadamente do interior.

O resultado do processo de privatizações é elucidativo. O país está mais dependente dos grupos económicos e financeiros, mais endividado e com menos instrumentos para implementar uma política que tenha como prioridade a defesa do interesse nacional e a satisfação das necessidades dos que vivem e trabalham em Portugal. As populações pagam mais por piores serviços. Parte significativa dos trabalhadores das empresas privatizadas foi despedida, ao mesmo tempo que se acentuou a carga de trabalho dos que permaneceram em funções e se degradaram as suas condições laborais. Os únicos beneficiados foram os grandes accionistas que acumulam lucros fabulosos e detêm empresas que conferem um poder fundamental para condicionar e determinar as opções políticas.

TRAVAR E INVERTER O PROCESSO DAS PRIVATIZAÇÕES

Uma análise rigorosa às consequências do processo de privatizações, a evidência dos desvios entre os objectivos que presidiram ao seu desencadear e os resultados que se obtiveram, obriga a que se trave e inverta a alienação e esbulho do SEE. Caso fossem os interesses nacionais, os direitos das populações e dos trabalhadores a prioridade da acção dos sucessivos governos e há muito que tinha sido abandonado o processo de privatizações. Com a sua manutenção e aprofundamento fica claro que é o interesse dos grandes accionistas, nacionais e estrangeiros a determinar as opções políticas.

É neste quadro que se insere a privatização da CP Carga, a ameaça de privatização da CP, da REFER, da EMEF, das infra-estruturas portuárias, assim como da RTP. Esbulho a que se associa a anunciada concessão da gestão da Carris, STCP, Metropolitano de Lisboa e Metro do Porto à iniciativa privada, questão que se pode colocar a breve prazo também à TRANSTEJO e à SOFLUSA. O Estado fica com a parte não lucrativa destas empresas, cabendo aos privados a exploração da esfera rentável, numa nova forma de PPP que PSD e CDS pretendem inaugurar. As populações ficam com menos serviços, a preços cada vez mais incomportáveis. Os trabalhadores vêem reduzidos os seus direitos, desde logo pelo incumprimento por parte do Estado do determinado nas convenções colectivas. Tal e qual está configurado, uma vez mais, os únicos beneficiados serão os que vierem a controlar o negócio propiciado pelo Governo.

O mesmo se passa com a TAP, num processo que é lapidar quanto à natureza e efeitos dos processos de privatização.

10 RAZÕES PARA TRAVAR A PRIVATIZAÇÃO DA TAP

Entre muitos outros que se poderiam encontrar, são 10 os motivos pelos quais se tem de travar e inverter o processo de privatização de uma empresa que emprega directamente mais de 12 mil trabalhadores (a que se juntam mais de 10 mil postos de trabalho indirectos):

1 – A TAP, empresa de capitais 100% públicos, é o maior exportador nacional, com mais de 2 mil milhões de euros de vendas ao estrangeiro;

2 – A TAP tem um valor estratégico incalculável, é um factor de soberania para o país e uma âncora para o sector do turismo, é fundamental para garantir a unidade e mobilidade em todo o território nacional e essencial na ligação às comunidades portuguesas no estrangeiro;

3 - A TAP é garantia de capacidade de investigação, manutenção e desenvolvimento técnico no sector da aviação civil, de referência em todo o espaço lusófono.

4 – Foram os interesses privados e não o bem público que presidiram aos negócios ruinosos na VEM (empresa de manutenção no Brasil), numa clara alusão ao que poderá acontecer caso a TAP fosse privatizada;

5 – Não obstante a gestão negligente da programação da actividade no último Verão, a que se juntou a impossibilidade de contratação de mais pessoal, a TAP apresenta resultados operacionais positivos;

6 – As anteriores tentativas de privatização, sempre falhadas pela acção dos trabalhadores, são paradigmáticas. A primeira interessada, a SWISSAIR, acabou por falir, enquanto a TAP se mantém no cumprimento da sua missão; a segunda tentativa fracassou, por alegada falta de garantia bancária do empresário Efromovich;

7 – À semelhança de Efromovich, alguns dos anunciados interessados na privatização da TAP levantam dúvidas quanto á sua idoneidade. Veja-se o caso da coligação de Pais do Amaral com Frank Lorenzo, antigo accionista da Eastern Airlines, que na sequência da gestão que fez daquela empresa, foi proibido de deter uma companhia aérea comercial pelo Departamento de Transportes dos EUA. Já a Globália, teve presente na privatização da SPDH, com uma gestão que gerou avultados prejuízos e obrigou a TAP a recuperá-la;

8 – O valor pelo qual o Governo está disposto a alienar a TAP é um verdadeiro esbulho ao erário e património público, sendo que dos mil milhões contabilizados como passivo, mais de metade dizem respeito ao leasing da frota, ou seja são um activo;

9 – Nas mais que previsíveis e negativas consequências da transformação da TAP como empresa pública ao serviço do interesse nacional, em empresa subordinada aos interesses privados, está ainda a questão da subvalorização do Aeroporto de Lisboa, que se poderá passar de ser um entreposto de referência, para ser mais um aeroporto regional, com implicações económicas imediatas no sector do turismo;

10 - Resistir e derrotar o processo de privatização, do todo ou em parte, da TAP será uma vitória sobre os sucessivos governos do PS, PSD ou CDS que, aliados à administração da TAP, tudo têm feito com vista à privatização da empresa, com a aceitação e subordinação às normas europeias que impedem os apoios estatais a empresas públicas, mas possibilitam-nos às transportadoras low-cost e incentivam a canalização de milhares de milhões para o pagamento de SWAP a juros agiotas, numa clara violação do preceito Constitucional que determina uma organização económica em que coexistem o sector público, o sector privado e o sector cooperativo e social.

INVESTIR NO SEE É APOSTAR NO DESENVOLVIMENTO

Considerando os interesses do país, a CGTP-IN exige:
• A suspensão imediata dos processos de privatização em curso, já com a TAP, e o abandono da intenção de alienar mais participações do Estado em outras empresas;
• A melhoria quantitativa e qualitativa dos serviços públicos prestados pelas empresas onde o Estado detém mecanismos para condicionar o destino e rumo das empresas, com vista a dar resposta às necessidades da população e não ao interesse dos grandes grupos económicos;
• A dotação das empresas públicas das condições financeiras necessárias para que possam prestar um serviço público de qualidade sem recorrerem ao endividamento privado, quer no que toca à actividade operacional, quer em matéria de investimento;
• O reforço da presença do Estado nas empresas em que, não detendo os mecanismos para condicionar o seu destino e rumo, são essenciais à economia e para a produção de bens públicos;
• O reforço do Estado nas empresas que são instrumentais para o contributo para a coesão social, territorial e o desenvolvimento do país, nomeadamente no sector financeiro, da energia, das comunicações e telecomunicações, dos transportes, dos resíduos sólidos e da água.

A CGTP-IN manifesta ainda o seu apoio e solidariedade aos trabalhadores da TAP e reafirma a sua disponibilidade para apoiar as lutas que considerem necessárias para travar este atentado contra o interesse público e a economia do país.

Lisboa, 17 de Novembro de 2014