DIA MUNDIAL DA ÁGUA 2014
Dia 22 de Março, Dia Mundial da Água, este ano sob o tema «Água e Energia». Dois bens essenciais à vida e dignidade humanas cujo controlo e gestão públicas são cada vez mais importantes para assegurar direitos fundamentais, o desenvolvimento solidário e a preservação do meio ambiente.
Neste dia especial, a CGTP-IN quer chamar a atenção das trabalhadoras e dos trabalhadores sobre uma questão que lhes toca directamente todos os dias! A água deve ter um preço justo e não deve servir interesses económicos privados. As energias e nomeadamente a electricidade é de igual modo de interesse vital para as populações, não pode servir para especulações de interesses privados. A água, o sol, o vento e a terra são bens vitais para toda a população e a sua utilização deve servir a todos, a custo mínimo. Por isso devemos proteger o ambiente, reduzir a poluição e evitar que os poderosos, sob pretexto de servir Portugal, se apropriam destes bens par benefícios próprios.
Como membro da Plataforma Água de Todos, a CGTP-IN divulga o Comunicado que comemora o Dia Mundial da água.
No próximo dia 22 de Março assinala-se o Dia Mundial da Água, este ano sob o tema «Água e Energia». Sãodois bens estratégicos sem os quais o progresso económico e a vida social não se podem sustentar. É por isso que são tão cobiçados e ambos têm vindo a ser alvo de políticas e medidas visando a sua apropriação privada e especulativa num processo ambientalmente insustentável e socialmente injusto.
De acordo com as Nações Unidas, em 2011, cerca de 768 milhões de pessoas não tinham acesso a água limpa e 2,5 mil milhões não possuíam serviços de saneamento adequados.
Mais de 1,3 mil milhões de pessoas não possuíam acesso à electricidade e aproximadamente 2,6 mil milhões utilizaram biomassa para cozinhar.
Estarealidade intolerável torna evidente que as políticas de água e de energia necessárias nãopodem ser as que dão mais lucro ao capital, nem são aquelas que depositam no “mercado” a resolução dos problemas ligados ao acesso a estes serviços essenciais, sob pena de se gerar mais desigualdade e exclusão. As políticas necessárias são as que, assegurando o controlo público destes dois bens essenciais e estratégicos, os coloquem ao serviço das pessoas, do desenvolvimento harmonioso e solidário e da conservação do meio ambiente.
Em Portugal: subordinação ao mercado e ao lucro
Nosector energético, a privatização iniciada na década de noventa do século passado, conduziu a uma situação de monopólio privado na oferta de energia dominada pelos grandes interesses económicos com reflexos particularmente evidentes nos altos preços da electricidade e nos lucros especulativos anuais obtidos pela EDP, mais de mil milhões de euros em 2013.
No caso da água, o objetivo do governo, prosseguindo políticas de governos anteriores, é transformar a água num negócio altamente lucrativoe entregar à exploração privada as infraestruturas hidráulicas e os serviços públicos de água e saneamento conquistados e construídosa partir da Revolução de 25 de Abril.
É nessa linha que, nomeadamente, se integram as pressões e chantagens exercidas sobre as Autarquias para forçar a integração dos serviços municipais de águas nas empresas do grupo Águas de Portugal. Empresas que o governo pretende fundir e reduzir a apenas 4 para posteriormente as entregar de mão-beijada aos grupos privados. E é para garantir esse negócio que o governo atribuiu à ERSAR (Lei nº10/2014) o poder de definir os preços quer para os sistemas multimunicipais quer para os sistemas detidos pelos municípios, que serão obrigados a aplicar preços cada vez mais elevados, decididos pelo governo/regulador, violando grosseiramente a autonomia local e penalizando gravemente as populações.
As consequências desta política são já hoje evidentes, seja no caso dos sistemas multimunicipais com dezenas de municípios em situação financeira dramática decorrentes dos encargos de pagamento impostos pelo Governo/Águas de Portugal, seja no caso das concessões/privatizações municipais, negócios que como a recente Auditoria do Tribunal de Contas comprovou são altamente lesivos para os municípios e as populações que são obrigados pagar todos os custos, enquanto os privados arrecadam os lucros.
A factura da privatização: pobreza energética e hídrica
A subordinação destes serviços públicos ao mercado e ao lucro e o brutal empobrecimento a que milhões de Portugueses estão a ser forçados leva a que sejam cada vez mais as famílias que estão a ser “desligadas” do acesso a estes bens essenciais.
O Comité Económico e Social Europeu estima que apenas entre 2011 e 2012 o preço ao consumidor da eletricidade tenha aumentado quase 7%. Um acréscimo que se pensa que atirou cerca de 50 milhões de europeus para uma situação de pobreza energética.
Em Portugal, o preço da electricidade aumentou 32% nos últimos 3 anos, conduzindo milhares de famílias para uma situação dramática, patente no corte abrupto do fornecimento de electricidade em várias habitações dos bairros sociais da cidade do Porto. Mas os cortes não se circunscrevem aos bairros sociais. No distrito do Porto, só entre Janeiro a Outubro de 2012, foi cortada a electricidade a mais de 196 famílias e empresas por dia. No distrito de Setúbal, e em resposta ao Grupo Parlamentar do PCP, o Governo reconheceu que em 2013 a EDP procedeu a 43.658 cortes do fornecimento de electricidade, ou seja, quase 120 por dia.
Na água, a amplitude da exclusão está longe de ser conhecida, mas os dados conhecidos confirmam que o peso da factura, bem mais cara na gestão privada, é um obstáculo cada vez mais intransponível para o orçamento de milhares de famílias.
Em 2012, só em seis cidades, cerca de 6 000 famílias ficaram sem abastecimento de água potável por falta de pagamento cada mês (Visão, Novembro, n.º 1029). Na cidade de Lisboa, o governo confirma numa resposta aos deputados comunistas que a EPAL cortou em 2013 o abastecimento de água a 11 836 clientes domésticos, uma subida de 15,41% face aos cortes realizados em 2012 pela mesma empresa e de 17,8% em comparação com as interrupções por falta de pagamento realizadas em 2011.
E a situação não é mais grave porque pese embora as dificuldades as autarquias praticam ainda preços sociais. Por tudo isto o cenário da privatização afigura-se no mínimo aterrador.
Isto mostra que o direito humano à água e ao saneamento não só está longe de ser plenamente garantido e assegurado como é seriamente ameaçado pelas políticas em curso. No contexto actual, de grave crise económica e social, de ataque aos direitos e aos serviços públicos, a negação do acesso a estes serviços, em particular à água e ao saneamento, é ainda mais intolerável, na medida em que isso agrava de forma insuportável a vida das populações e põe gravemente em risco a saúde das pessoas.
Face a isto a Campanha «Água é de todos» reafirma que estes serviços são elementos essenciais à dignidade da vida humana. No caso da água, a sua natureza vital e essencial levou a Assembleia-Geral das Nações Unidas a aprovar, em Julho de 2010, uma Resolução consagrando o direito à água e ao saneamento básico como "um direito humano essencial para o pleno gozo da vida e de todos os direitos humanos. "
Isto significa que os Estados, como Portugal, e os governos, central e local, devem garantir o acesso à água potável e saneamento para todos os seus cidadãos e fazê-lo sob os princípios da universalidade e acessibilidade sem discriminação de qualquer condição, seja social, económica, de género, cultural ou outra; continuidade: o acesso deve ser garantido 24 horas por dia, 365 dias, princípios e objectivos que só uma gestão pública, democrática e participativa está em condições de proporcionar.
Um direito que não pode ser negado a quem não possa pagar, o que implica adoptar medidas que assegurem que oscidadãos e as famílias não sejam privados do fornecimento de água (e de energia eléctrica), nos períodos da sua vida em que se encontrem em situação de insuficiência de rendimentos.
Consagrar o direito à água, impedir a privatização
Assumindo a defesa do direito à água e o combate à privatização, a Campanha «Água é de todos» entregou no Parlamento em Fevereiro de 2013, a Iniciativa Legislativa de Cidadãos «Protecção dos direitos individuais e comuns à água», actual Projecto de Lei Nº 368/XII, subscrita por mais de 44 mil cidadãos, visando:
- Consagrar o direito à água e ao saneamento na legislação portuguesa, competindo ao Estado garantir e assegurar o seu efectivo cumprimento.
- Edificar uma política de água que dê prioridade à satisfação e necessidade humanas, ao interesse comum, à adequação ecológica e preservação da água.
- Impedir a privatização da água e dos serviços públicos, mantendo a sua propriedade e gestão na esfera pública e promover o regresso ao sector público dos serviços privatizados/concessionados.
Realizadas duas audições e após aprovação do parecer pela Comissão de Ambiente, o projecto de lei foi enviado no dia 3 de Julho de 2013 para a Presidente da Assembleia da República, onde aguarda o respectivo agendamento e debate para votação em plenário.
Esta é uma proposta que restitui direitos fundamentais e cumpre a vontade da enorme maioria da população portuguesa, largamente favorável à propriedade e gestão públicas da água. Por estas razões consideramos o seu debate inadiável e a sua aprovação uma exigência social, certos de que isso é indispensável para travar o empobrecimento, a exclusão e garantir que a água continuará a ser de todos e para todos.