Proposta de Decreto-Lei que estabelece o regime de regulação do acesso e exercício de actividade de ama, bem como o regime sancionatório aplicável à respectiva actividade. A presente Proposta de Decreto-Lei tem como objectivo central a completa liberalização da actividade das amas, abrindo ao mercado o exercício desta actividade.
O actual regime aplicável à actividade das amas (consubstanciado no Decreto-Lei nº 158/84, de 24 de Maio e no Despacho Normativo nº 5/85, de 18 de Janeiro) foi estabelecido no âmbito da intervenção de apoio às famílias, numa lógica de cooperação entre as amas e instituições de enquadramento (a própria Seguranças Social, a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa e IPSS mediante acordos com a segurança social), tendo estas como função apoiar o exercício da actividade de acolhimento de crianças pelas amas, incluindo a formação, o apoio técnico, o fornecimento de materiais e equipamentos e o pagamento da retribuição.
Nos termos da presente Proposta, a actividade de ama enquadrada e apoiada pela segurança social deixa de existir (dentro de um ano, que é o período transitório fixado para este efeito), o que, em primeiro lugar, significa que o acolhimento de crianças pelas amas deixa de ser configurado como uma resposta social, para passar a ser um serviço inteiramente privado prestado às famílias. Consequentemente, no que respeita ao acolhimento de crianças por amas, deixa de haver qualquer comparticipação pública para as famílias de menores recursos.
A CGTP-IN não pode deixar de repudiar mais esta forma de diminuir a oferta pública em termos de acolhimento de crianças e de reduzir os apoios sociais às famílias, que além do mais se mostra em total contradição com o objectivo de promover a natalidade, que este Governo tem anunciado como uma das suas prioridades.
Em segundo o lugar, esta abertura ao mercado da actividade das amas conduz à completa precarização da situação laboral destas profissionais.
Se no actual regime a situação laboral das amas já é sobremaneira precária, na medida em que, embora desenvolvendo a sua actividade no enquadramento e sob estrita supervisão e controlo da instituição de enquadramento, são classificadas como trabalhadoras independentes em regime de prestação de serviços, nos termos da presente Proposta não só continuam a trabalhar em regime de prestação de serviços, com ficam inteira e verdadeiramente por conta própria, sem qualquer apoio técnico ou material.
Efectivamente, no actual regime, embora sendo trabalhadoras independentes (com todos os prejuízos que tal situação acarreta a nível laboral e social), as amas enquadradas pelas instituições da Segurança Social ou pela Santa Casa da Misericórdia de Lisboa, dispõem de apoio técnico e formação inicial e contínua proporcionada por estas instituições, as quais fornecem igualmente os materiais e equipamentos necessários ao acolhimento das crianças; por outro lado, o contrato de prestação de serviços é celebrado com estas mesmas instituições, que são também responsáveis pelo pagamento da retribuição, que se encontra legalmente fixada.
De acordo com o novo regime contido nesta Proposta, as amas celebram individualmente um contrato de prestação de serviços com a família da criança acolhida, no qual serão obviamente fixadas todas as condições da prestação desse mesmo serviço incluindo a retribuição, o que significa que esta deixar de ter um valor certo, para passar a depender inteiramente das condições do mercado. Além disso, as amas deixarão de dispor de qualquer apoio técnico externo, terão de se encarregar da aquisição e manutenção de todos os materiais e equipamentos necessários ao exercício da sua actividade (em cumprimento dos requisitos exigidos na lei) e serão ainda responsáveis pela sua formação nos termos que a lei exige.
Note-se que, embora o exercício da actividade de ama continue a ser legalmente possível no âmbito de uma instituição de enquadramento (que, de acordo com esta Proposta, só pode ser a Santa Casa da Misericórdia de Lisboa ou uma IPSS ou instituição equiparada), esta forma de exercício de actividade nem sequer aparece regulada na Proposta, demonstrando que a prioridade do Governo nesta matéria é de facto a total entrega da actividade ao mercado.
No entender da CGTP-IN, a presente Proposta de Decreto-Lei configura uma solução claramente desfavorável quer para as trabalhadoras que exercem esta actividade, e cujo estatuto laboral será consideravelmente agravado, quer para as famílias que, por um lado, deixarão de ter a garantia e segurança conferidas pelo facto de as amas serem tecnicamente apoiadas no acolhimento das suas crianças por uma instituição pública fiável e, por outro, serão privadas de mais uma resposta social pública, acessível a todos, incluindo as famílias de menores recursos.
Finalmente, não podemos deixar de prever que esta total abertura ao mercado da actividade de ama, em resultado dos enormes encargos que vai fazer pesar sobre as trabalhadoras que quiserem exercê-la os quais irão necessariamente reflectir-se num agravamento dos custos para as famílias, é susceptível de conduzir à proliferação de amas ilegais, com todos os riscos acrescidos que tal acarretará para as crianças envolvidas.
Neste quadro, a CGTP-IN rejeita a presente Proposta, defendendo que a actividade das amas deverá continuar a ser exercida no enquadramento e em cooperação com as instituições de segurança social, conferindo-se às amas o estatuto de trabalhadoras por conta de outrem das instituições em que se enquadram, e continuando o acolhimento de crianças em amas a ser considerada como resposta social plena, comparticipada publicamente em função dos rendimentos das famílias.
20 de Março de 2015