IGUALDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO, E PARENTALIDADE
A CIMH/CGTP-IN considera que a revisão do Código do Trabalho, em matéria de Igualdade e não discriminação, não só não apresenta medidas que reforcem o combate à discriminação como fragiliza a participação dos/as trabalhadores/as e das organizações sindicais na promoção de medidas para a efectivação dos direitos de igualdade entre mulheres e homens no local de trabalho, ao mesmo tempo que facilita o patronato pelo não cumprimento de algumas normas.

 

REVISÃO DO CÓDIGO DO TRABALHO

(Proposta de Lei n.º 216/X, de 19 de Julho de 2008)

IGUALDADE E NÃO DISCRIMINAÇÃO, E PARENTALIDADE

A Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens (CIMH/CGTP-IN), na sequência da apreciação feita pela CGTP-IN, sobre a revisão do Código do Trabalho enviada à Assembleia da República analisou, especificamente, algumas matérias relativas à Igualdade e não discriminação e sobre a Parentalidade, apresentando as suas considerações, avaliação e perplexidade, face a estas matérias.

Igualdade e não discriminação: Algumas considerações

A CIMH/CGTP-IN considera que a revisão do Código do Trabalho, em matéria de Igualdade e não discriminação, não só não apresenta medidas que reforcem o combate à discriminação como fragiliza a participação dos/as trabalhadores/as e das organizações sindicais na promoção de medidas para a efectivação dos direitos de igualdade entre mulheres e homens no local de trabalho, ao mesmo tempo que facilita o patronato pelo não cumprimento de algumas normas.

Consideramos, ainda, que em matéria de defesa destes direitos, o conteúdo dos artigos que a ela se referem não é suficientemente forte quanto à penalização das empresas que os violam.

Referimo-nos, concretamente, ao artigo 25º ”Direito à igualdade no acesso a emprego e no trabalho), nº 5, onde se diz, que constitui apenas contra ordenação leve, a violação do dever de fixar na empresa em local adequado a informação relativa aos direitos e deveres do/a trabalhador/a em matéria de igualdade e não discriminação.

A experiência diz-nos, que existindo esta desvalorização das empresas em relação à divulgação do conhecimento destes direitos para os trabalhadores estão a criar-se condições para restringir a informação e a divulgação de direitos fundamentais no local de trabalho.

Também no artigo 28º “Medida de acção positiva” se diz, que esta medida é direccionada para corrigir situações de desigualdade que persistam na vida social.

Esta referência, evocada de forma abstracta, omite uma realidade que é a persistência de profundas desigualdades entre mulheres e homens nos locais de trabalho e para as quais as entidades patronais não apresentam soluções.

Neste sentido, quanto a esta matéria, pensamos, que a medida de acção positiva deveria ser, também, direccionada para as empresas e serviços, como um princípio a respeitar e uma forma de diálogo e participação das estruturas representativas dos/as trabalhadores e trabalhadoras, e um estimulo à negociação colectiva no sentido de incentivar o diálogo social no mundo do trabalho.  

O trabalho que a CGTP-IN tem desenvolvido, no âmbito dos Projectos Equal e outros, mostra que estas medidas quando assumidas com carácter de “acções positivas”, têm contribuído, de forma decisiva, para corrigir situações de desigualdade em relação às mulheres, nomeadamente, em relação às assimetrias salariais, que persistem nos locais de trabalho, nas empresas e serviços.

Referimos, ainda, como negativo, que a proposta de revisão Código não inclua o nº 2 do artigo 31 do actual Código em vigor, onde se estabelece que os instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho devem conter, sempre que possível, disposições que visem a efectiva aplicação das normas sobre a igualdade e não discriminação.

O seu desaparecimento é, também, para esta Comissão, uma desvalorização do papel da contratação colectiva na promoção e efectivação do princípio da igualdade e de tratamento e da não discriminação, nas empresas e serviços.

Com esta Proposta de Lei para revisão do Código do Trabalho, alguns artigos sobre os direitos de igualdade e não discriminação não são reforçados nem aprofundados como exige a situação actual de aprofundamento das discriminações, afigurando-se como meras “figuras de estilo” sem a substância concreta (a integração de matérias da contratação colectiva) que lhe dê conteúdo e força e que faz da norma jurídica um instrumento fundamental para a efectivação dos direitos, no local de trabalho. 

Parentalidade: Avaliação e perplexidade sobre algumas questões concretas

A “Parentalidade” é o título da subsecção IV, assim como do Artigo 34.º. A introdução deste título submete todos os artigos deste Código do 34.º ao 65.º, ao seu âmbito.

Neste sentido, a maternidade e a paternidade que, face à Constituição da República Portuguesa são direitos sociais fundamentais e considerados valores sociais eminentes, ficam subordinados a um conceito que, em matéria jurídica e constitucional, não possui qualquer definição legal individualizada.

A substituição da designação do direito de maternidade e de paternidade pelo conceito de “Parentalidade” na revisão do Código do Trabalho afigura-se-nos redutora e desajustada, porque não possui qualquer correspondência com os conceitos que estão definidos na Constituição da República Portuguesa e nos textos internacionais – normas da OIT e Comunitárias.

Esta disposição formal, a ser aprovado como está, sugere a esta Comissão as seguintes interrogações: como vai ser regulamentada? Como vai ser feita a sua aplicação legal? Qual o conceito que prevalece?

Não é, para nós, compreensível o objectivo da mudança de conceito, na proposta de revisão do Código do Trabalho, quando em diplomas recentemente publicados, como o Estatuto de Carreira da Função Pública, o conceito existente neste diploma é: “Protecção da maternidade e paternidade e adopção”.

Na legislação nacional e comunitária a referência aos direitos de maternidade e de paternidade são inerentes aos direitos civis e sociais dos cidadãos e das cidadãs, fazendo parte do ordenamento jurídico laboral, enquanto património dos direitos sociais das trabalhadoras e dos trabalhadores.

A prová-lo, mostram as diversas iniciativas que estão em curso, a nível europeu e internacional, com o objectivo de combater à discriminação das mulheres em função da maternidade, no reforço da participação dos homens na vida familiar, no estímulo ao exercício dos direitos de paternidade, e no alargamento e reforço da licença parental.

São exemplo destas iniciativas, a campanha da OIT, sob o lema: “A Igualdade no Coração do Trabalho Digno”, a campanha da CES, para “A Luta pela Igualdade Salarial”, as negociações no âmbito do Diálogo Social Europeu, sobre o alargamento da licença parental.

Por estas razões, entendemos que este conceito “Parentalidade” só vem introduzir confusão de compreensão aos destinatários, tendo em conta:

a) A falta de clareza do seu propósito;

b) A contradição que enforma em relação à lógica de distinção de título “Parentalidade” e a subalternidade dos conceitos de maternidade e de paternidade como valores sociais eminentes, face à Constituição;

c) As alterações que irão ser introduzidas em todo o sistema social, nas instituições, nas organizações e no relacionamento social.

Consideramos, ainda, que, para além do vínculo parental, jurídico, social e moral que a maternidade e a paternidade representam, a imagem simbólica da mãe e do pai tem fortes raízes na nossa cultura, constituindo um valor social e cultural integrador e estabilizador das relações afectivas familiares, que a legislação de trabalho não pode ignorar e que não devem ser subvertidos.

No Artigo 36.º “Protecção na parentalidede”, não se enumera o direito de “Dispensa para amamentação” mas “Dispensa para aleitação”.

Consideramos que a licença para aleitação não abrange a licença para a amamentação e afigura-se-nos como redutora a ideia de que aleitação inclui a amamentação, porquanto ser distinta a natureza dos conceitos.

Para esta Comissão, a ausência de referência deste direito é contrário ao superior interesse da criança que, tem na amamentação um alimento fundamental para o seu desenvolvimento físico e psicológico, conforme todas as referências médico/científicas o indicam.

Quanto à licença parental, artigo 44º, 2, que estabelece que o pai tem 10 dias úteis de licença seguidos ou interpolados, desde que gozados em simultâneo com o gozo da licença parental por parte da mãe constitui um direito inferior ao estabelecido actualmente, que permite que o mesmo tenha direito a gozar os primeiros 15 dias de licença parental, desde que sejam imediatamente subsequentes à licença de maternidade ou de paternidade, sendo estes actualmente remunerados a 100% pela Segurança Social.

Na perspectiva da CIMH/CGTP-IN, a nova norma contida no artigo 44.º nº 2 da Proposta de revisão do Código do Trabalho constitui uma falácia na medida em que o Governo anunciou um alargamento dos direitos já existentes, o que não corresponde à verdade.

No tocante ao regime de faltas para assistência a neto previsto no artigo 50.º nº 3 da Proposta de Lei, conferindo o direito a faltar aos avós, para prestar assistência inadiável a neto menor, independentemente da idade, em caso de doença ou acidente, só é para nós aceitável quando corresponde a uma inevitabilidade e em circunstâncias em que a mãe ou o pai não podem assumir, plenamente, as suas responsabilidades, conforme constam na Constituição da República Portuguesa. É o caso, por exemplo, da maternidade e paternidade nos/as adolescentes, menores de idade, jovens deficientes, famílias monoparentais.

De outro modo, entendemos, poderá constituir um incentivo a que os empregadores exerçam pressão sobre os progenitores mais jovens e muitas vezes contratados em regime de contrato precário, para não exercerem os seus direitos de apoio à família, pelo que consideramos não ser uma medida adequada a fomentar a responsabilidade parental.

No artigo 51.º nº 3 da actual Proposta de Lei, estabelece-se uma nova restrição ao gozo da licença parental (agora denominada de licença parental complementar) ao estabelecer que “se ambos os progenitores gozam simultaneamente a licença e estiverem ao serviço do mesmo empregador, este pode adiar a licença de um deles com fundamento em exigências imperiosas ligadas ao funcionamento da empresa ou serviço, desde que seja fornecida a respectiva fundamentação”.

Mais uma vez, referimos, que o interesse da criança fica subordinado aos interesses da empresa e a função social da maternidade e da paternidade é claramente desrespeitada por parte dos empregadores e uma violação da Directiva nº 96/34/EC, legitimada pelo Código do Trabalho.

Consideramos que o artigo 54.º da actual proposta de lei é mais restritivo, que o regime da redução do tempo de trabalho para assistência a filho menor com deficiência ou doença crónica actualmente vigente, tendo em conta que na redacção do actual artigo 37 só se fala de “filho menor” e agora fala-se “em menor com idade não superior a 1 ano …”o que restringe claramente a utilização do direito à redução do tempo de trabalho. Por outro lado, o nº 4 desta nova norma, também restringe o uso efectivo do direito, em caso de existirem “exigências imperiosas do funcionamento da empresa”, o que constitui a criação de um novo condicionalismo de restrição ao exercício de um direito, relacionado com a protecção da criança e põe em causa a efectivação de um direito fundamental.

Verifica-se, ainda, que o artigo 62.º da actual Proposta de Lei sob a epígrafe “protecção da segurança e saúde de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante” não contem qualquer conteúdo no seu nº 6, o que se estranha.

O mesmo acontecendo no artigo 65.º da mesma proposta de Lei onde também se verifica não existir qualquer conteúdo nos seus nºs 3 e 4 apesar de o nº 8 desse mesmo artigo os referenciar como da sua violação poder resultar a existência de uma contra ordenação grave.

Considerando que esta é uma das matérias que as entidades patronais e os responsáveis pela Administração Pública viola constantemente, esta omissão tenderá a aprofundar as discriminações das trabalhadoras em função da maternidade.

A CIMH/CGTP-IN, face a esta situação, apresenta as seguintes propostas:

1 – Sobre a Igualdade e não discriminação, defendemos:

  1. A integração das nossas sugestões e considerações, relativamente as normas que reforcem o combate às discriminações no local de trabalho e defendam a igualdade de oportunidades e de tratamento entre mulheres e homens, no trabalho e no emprego;
  2. A aplicação dos direitos consagrados na contratação colectiva, nomeadamente, o princípio de tratamento mais favorável.
  1. O reforço dos mecanismos jurídicos e institucionais, que garantam o cumprimento da lei e penalize os infractores.

2 – Sobre a maternidade e a paternidade, defendemos:

  1. A retirada do conceito de “Parentalidade”, por não estar consagrado na Constituição da República Portuguesa e apresentar-se confuso, contraditório e sem definição jurídica individualizada;
  1. O estabelecimento de horários de trabalho, que permitam a aplicação das medidas, constitucionalmente consagradas, sobre a conciliação entre trabalho, vida familiar e vida pessoal.

Pensamos, que esta reivindicação é de toda a justiça, considerando a importância do acompanhamento e apoio às crianças de menor idade, aos familiares dependentes e ao estímulo que estas medidas podem dar para o crescimento da natalidade e para uma maternidade e paternidade socialmente responsável, protegida pelo Estado e respeitada pelas entidades privadas e públicas.

As propostas sobre a adaptabilidade dos horários de trabalho, que se encontram na proposta de revisão do Código do Trabalho contrariam esta filosofia de defesa de bem-estar das famílias, das crianças e dos jovens e, por isso, devem ser retiradas;

  1. A consagração da lei do pagamento dos 150 dias por licença de maternidade e de paternidade, com o pagamento a 100%, pela Segurança Social, cuja aplicação há muito defendemos, sem a imposição de ser o pai a gozar os trinta dias, por considerarmos que cabe aos progenitores esta decisão, tendo em conta o superior interesse da criança.

Lisboa, 30 de Setembro de 2008

Comissão para a Igualdade entre Mulheres e Homens/CGTP-IN