orcamentoPrograma de Governo e Proposta de Orçamento do Estado para 2022: Faltam respostas e soluções para os problemas crescentes dos trabalhadores e das populações

Os trabalhadores, os reformados e pensionistas e a generalidade da população vivem hoje numa situação particularmente difícil em que os seus baixos rendimentos estão a ser amputados pela subida galopante do custo de vida.

Num contexto marcado pela fragilização dos trabalhadores na relação de trabalho, pelo enfraquecimento da contratação colectiva, pelo aumento das desigualdades, pela degradação dos serviços públicos e das Funções Sociais do Estado, pela persistência de pensões e salários que hipotecam a satisfação de necessidades básicas a um conjunto alargado da população e assim negam uma vida digna, pela desertificação de uma parte do território, a CGTP-IN considera que o Programa de Governo e a Proposta de Orçamento do Estado para 2022 (Proposta de OE22) tem que desenvolver uma política que valorize o trabalho e os trabalhadores, promova os serviços públicos de qualidade e garanta o financiamento do Estado através de uma tributação que, garantindo mais recursos, incida sobre os rendimentos do capital, desonerando aqueles que têm como origem o trabalho.

O brutal aumento de preços de bens e serviços essenciais exige medidas que ponham travão à especulação que caracteriza algumas destas subidas. Exige, também, que o poder de compra dos trabalhadores, reformados e pensionistas seja aumentado.

Antes mesmo da condenável guerra na Ucrânia, já os trabalhadores e suas famílias eram confrontados com aumentos insustentáveis, situação que se agrava com a guerra e com as sanções que afectam, essencialmente, os trabalhadores, os reformados e as camadas mais desfavorecidas da população.

O Governo reconhece que a inflação vai ser maior (3,7%) do que aquela que ainda há pouco previa (2,9%). O valor de 3,7% pode vir a ser ultrapassado, tendo o Banco de Portugal admitido que chegue a 5,9% num cenário adverso. O Governo recusa, porém, que os salários acompanhem a inflação com o argumento de que se desencadearia uma “espiral inflacionista”.

A CGTP-IN rejeita que seja ainda mais degradado o poder compra dos trabalhadores e pensionistas. Não são os salários que estão na base do aumento dos preços. Tem que haver regulação dos preços dos bens essenciais, a especulação no sector energético e dos combustíveis tem de ser travada e as medidas apresentadas Proposta de OE22 não o fazem, em particular na gasolina e gasóleo. Os aumentos salariais dos últimos anos não tiveram quaisquer efeitos no aumento da inflação.

A CGTP-IN lembra que o Governo prevê na Proposta de OE22 um crescimento económico de 4,9% em 2022 e um aumento da produtividade do trabalho de 3,5%. Sem aumento salarial, haverá, para além da quebra do poder de compra, efeitos económicos desfavoráveis uma vez que se deprime o consumo o qual tem um papel essencial no estímulo da actividade económica.

O aumento geral dos salários assume, assim, um carácter de ainda maior urgência.

O Governo, por via da Proposta de OE22, por via da Proposta de OE22, tem a obrigação de responder às necessidades dos trabalhadores da Administração Pública que tiveram este ano uma actualização salarial de apenas 0,9% e que sofreram uma forte perda de poder de compra nas duas últimas décadas.

Tem a obrigação de reavaliar a subida o salário mínimo nacional (SMN), que de “histórico” passou a irrisório com o aumento do custo de vida sentido por quem o aufere, pelos 11% de trabalhadores que já empobreciam a trabalhar e por muitos outros que são abrangidos pelos baixos salários. A caducidade da contratação colectiva e a insistência em recusar reintroduzir o princípio do tratamento mais favorável, são normas que têm de ser revogadas. O exercício da actividade sindical tem de ser garantido.

O Governo tem a obrigação de repor a perda do poder de compra das pensões ao longo de anos, pois foram aumentadas num valor médio inferior a 0,9% em 2022.

Estas são matérias ausentes do Programa que o Governo apresentou ao país.

Para a CGTP-IN é essencial uma valorização do trabalho e dos trabalhadores, que contemple o aumento geral dos salários em 90€ para todos os trabalhadores e a fixação do SMN nos 850€ no curto prazo; que aumente todas as pensões que permita o envelhecimento com dignidade a quem trabalhou uma vida inteira; que avance na redução do tempo de trabalho, com a fixação do seu máximo nas 35 horas semanais sem perda de retribuição, bem como horários de trabalho regulados.

Exigimos o combate ao flagelo da precariedade, com o cumprimento do preceito que um posto de trabalho permanente tem de ser ocupado por um trabalhador com vínculo efectivo.

O Governo remete para a Concertação Social (CPCS) a discussão de grande parte desta matéria, tendo como ponto de partida um documento que não inclui as medidas de fundo que os problemas exigem.

Não será na CPCS, mas sim na organização, unidade e luta que os trabalhadores irão conquistar os direitos e condições de vida que exigem e a que têm direito.

No Programa e na Proposta de OE22 sobram as “contas certas” do Governo em contraponto ao empobrecimento dos trabalhadores, aos orçamentos exauridos dos serviços públicos, a um crescimento económico que não permite a convergência com os restantes países da UE e a uma desigualdade que cresce ao sabor dos lucros acumulados pelos detentores dos grandes grupos económicos e financeiros.

O Programa de Governo e a Proposta de OE22 não apostam o suficiente no investimento público, que é um instrumento essencial para desenvolver o país, melhorar a resposta pública na saúde, na educação, na cultura ou, entre outras áreas, na justiça e protecção social. O investimento público é essencial para alavancar a produção nacional e assim reduzir a dependência crescente face a um contexto exterior cada vez mais imprevisível.

O investimento público aparece na Proposta de OE22 fortemente dependente do PRR (sem o PRR o investimento de 2022 seria inferior ao 2021), seguindo a dependência face aos fundos europeus. Entre 2014 e 2020 cerca de 90% do investimento público esteve dependente de fundos comunitários.

Para a CGTP-IN o reforço dos serviços públicos e das Funções Sociais do Estado exige a garantia da valorização de carreiras e salários, investir nos equipamentos, melhorar os serviços que são prestados às populações.

A renovação da força de trabalho na Administração Pública com vínculos efectivos é crucial atendendo a que perto de 1/3 dos trabalhadores tem 55 ou mais anos, ao aumento progressivo dos trabalhadores que se aproximam da idade de reforma (este escalão etário era na ordem dos 16% em 2011) e à existência de sectores e de categorias profissionais onde o Estado tem dificuldade em reter ou recrutar trabalhadores, incluindo os mais qualificados. Este problema é transversal a toda a Administração Pública, mas mais agudo nalguns sectores como na saúde e da educação.

Na educação, na cultura, na protecção social e também na saúde. O reforço do SNS tem de ser uma prioridade, travando a sangria de recursos humanos que os operadores do negócio privado estão a fazer no serviço público. O OE22 não dá resposta a estes problemas.

No contexto da segurança social, é para a CGTP-IN fundamental transferir – com origem no OE e não nos saldos da própria segurança social – as verbas despendidas com a COVID-19. O compromisso claramente assumido na Lei do Orçamento do Estado para 2021 vai no sentido de que o financiamento das medidas COVID 19 deve ser integralmente assegurado por transferências do Orçamento do Estado. Não há lugar a dúvidas e por isso exigimos que o OE22 corrija esta prática.

Ao nível da fiscalidade, para alé m da exigência que reiteramos de redução do IVA da electricidade para os 6%, assim como o do gás e de todos os bens essenciais, escasseiam medidas para recuperar a fuga e evasão fiscal, bem como as que desonerem a fiscalidade que incide sobre os rendimentos do trabalho, passando a incidir sobre os rendimentos de capital.

Lembramos que Portugal pertence ao grupo de 10 países onde a incidência fiscal e contributiva é mais baixa na UE (35,1% do PIB face à média de 40,3% na UE); e que Portugal tem uma incidência de impostos directos de 28,5% do PIB (face a 33,2% na UE), o que constitui uma outra fonte de injustiça. De referir ainda que as transferências e envio de fundos para paraísos fiscais (off-shores) e territórios com tributação privilegiada representou em 2020 o valor de cerca 7 mil milhões de euros (3,4% do PIB).

Os salários e as reformas têm de aumentar. O empobrecimento anunciado pelo Governo para travar uma suposta “espiral nos preços” mais não é que a opção por manter intocável a espiral dos lucros.

A CGTP-IN, sem prejuízo de algumas medidas de carácter positivo e de uma análise mais pormenorizada ao OE22 e ao Programa de Governo, irá esclarecer e mobilizar os trabalhadores para a acção e luta que exija a resposta às reivindicações que garantem a melhoria das condições de trabalho e de vida e às soluções imprescindíveis para a resolução dos problemas dos trabalhadores e do país. Acção e luta que se intensificam nas empresas e serviços, dos sectores público e privado e que terão presença nas comemorações do 48º aniversário do 25 de Abril e que convergirão na Jornada Nacional de Luta do 1º de Maio – Dia Internacional do Trabalhador.

DIF/CGTP-IN

Lisboa, 14.04.2022